Reafirmação da DER e seus efeitos financeiros
A questão da reafirmação da Data de Entrada do Requerimento (DER) no Direito Previdenciário é marcada por intensas discussões doutrinárias e jurisprudenciais, especialmente no que concerne à fixação dos efeitos financeiros, bem como à possibilidade de reafirmação nos casos em que os requisitos para a concessão do benefício foram preenchidos antes do ajuizamento da demanda judicial. O Tema 995 do Superior Tribunal de Justiça (STJ) trouxe importantes contribuições nesse cenário, ao abordar a possibilidade de computar tempo de contribuição posterior ao ajuizamento da ação para fins de implementação dos requisitos necessários ao benefício. Contudo, é fundamental destacar que tal tema limitou-se a tratar da reafirmação da DER no âmbito judicial, sem analisar a hipótese de reafirmação ocorrida entre a data do requerimento administrativo original e o momento do ajuizamento da ação.
No julgamento do Tema 995, ficou estabelecido que, para os casos em que os requisitos para a concessão do benefício são implementados durante o curso do processo judicial, cabe ao juiz considerar tais fatos supervenientes, garantindo que a DER seja fixada no momento exato em que os requisitos foram preenchidos. Não obstante, a decisão não enfrentou a situação em que os requisitos são satisfeitos antes do ajuizamento, nem exigiu a formulação de um novo pedido administrativo ou indicou as consequências de eventual ausência desse pedido. De forma geral, a análise mais detalhada dessa hipótese tem sido objeto da atuação da Turma Nacional de Uniformização (TNU), que, em julgados em que entende que os efeitos financeiros, nesses casos, contam-se a partir da citação.
Ainda que a posição da TNU ofereça certa diretriz, além de dois julgados do STJ que existem no mesmo sentido, é necessário um exame mais aprofundado sob a perspectiva dos princípios que norteiam a reafirmação da DER, como a primazia do acertamento, a economia processual e a efetividade do direito. Esses princípios conduzem à conclusão de que é plenamente possível admitir a reafirmação da DER para situações em que os requisitos foram preenchidos antes do ajuizamento, sem a necessidade de novo pedido administrativo, mantendo-se o interesse de agir. Tal postura encontra respaldo na prática processual previdenciária, que busca assegurar a proteção dos direitos fundamentais dos segurados e garantir a efetividade das relações previdenciárias.
Para ilustrar essa discussão, imagine-se a seguinte hipótese: um segurado requer administrativamente a aposentadoria especial, que exige 25 anos de atividade laboral sob condições especiais. O pedido é indeferido, pois, à época, somente se reconheciam 24 anos de tempo especial. Durante os meses subsequentes, enquanto o segurado continua a exercer sua atividade, ele completa os requisitos necessários, mas ingressa com a ação judicial somente seis meses após a negativa administrativa. No curso do processo, a DER é reafirmada para o momento em que os 25 anos foram efetivamente alcançados, e o benefício é concedido. Nesse caso, se os 25 anos tivessem sido completados antes do ajuizamento, a exclusão da possibilidade de reafirmação geraria flagrante iniquidade e comprometeria os princípios da justiça e da segurança jurídica.
Ainda no campo dos efeitos financeiros, é crucial distinguir as hipóteses de reafirmação. Nos casos em que a DER é reafirmada após o processo administrativo e antes do ajuizamento da ação judicial, a jurisprudência majoritária considera que os efeitos financeiros têm início a partir da citação. Por outro lado, quando o processo judicial reconhece que o benefício era devido desde o requerimento administrativo original, os efeitos financeiros devem retroagir plenamente, uma vez que é dever da autarquia previdenciária realizar a análise completa dos requisitos no âmbito administrativo.
O entendimento de que os efeitos financeiros devem ser fixados desde o cumprimento dos requisitos promove a correta aplicação das normas previdenciárias, assegura a justiça ao segurado e reforça a confiança no sistema. Essa perspectiva alinha-se à Teoria da Primazia do Acertamento, que prioriza a proteção material dos direitos previdenciários em detrimento de formalismos processuais que comprometam a concretização da justiça social. Assim, a reafirmação da DER antes do ajuizamento, quando amparada pelos requisitos legais, protege o segurado contra atrasos administrativos e garante que os efeitos financeiros sejam contados de forma equitativa, fortalecendo a dignidade e a segurança jurídica no âmbito previdenciário.
Referências
Savaris, J. A. Princípio da primazia do acertamento judicial da relação jurídica de proteção social. novos estudos jurídicos, Itajaí (sc), disponível em: https://periodicos.univali.br/index.php/nej/article/view/4209 acesso em: 20 nov. 2024.
KIDRICKI, Tiago Beck, TRICHES, Alexandre Schumacher. Reafirmação da DER. – São Paulo: LTr, 2018.